Quantas foram as escolhas que tiveram grande impacto nos seus negócios, na sua profissão, nas suas finanças? Você se lembra da última vez que pôde escolher em quem iria orientar os rumos da sua vida? Somos capazes de mensurar o valor de nossas escolhas? Todas essas respostas podem ser dadas quando refletimos sobre a importância do voto. Ainda que a nossa sociedade se identifique cada vez mais como individualista e que a pós-modernidade nos ofereça individualmente uma gama de possibilidades de se adequar a padrões distintos daqueles que nos legaram, vivemos em uma coletividade e o voto é a maneira de participar das escolhas dos rumos da comunidade na qual pertencemos. Em momentos de crise política, narrativas que desqualificam a importância do voto e que lançam dúvidas sobre a eficácia do modelo de votação se tornam comuns. A crença de que a corrupção é inerente à política brasileira e a mais recente anomalia no cenário democrático, as fake news, vêm desestimulando o eleitor ao voto e, a mais perversa e perigosa consequência, oferecendo ao eleitorado uma falsa consciência política.
Mas uma inquietação deve ficar: se o voto fosse tão dispensável, as verbas destinadas para marketing de campanhas eleitorais não seriam milionárias e esse não seria um tema de disputas inflamadas para aprovação de nova legislação a esse respeito. No Brasil, país constituído como Estado democrático de direito, no qual “todo poder emana do povo que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente” (art. 1º, parágrafo único, da Constituição Federal de 1988), o direito de votar e ser votado é garantido. O sentido de democracia está na possibilidade de o povo exercer a soberania por meio do voto, escolhendo seus governantes. O voto é um importante instrumento de mudança política e social.
Mas nem sempre foi assim, o direito ao voto é uma conquista. O voto censitário, no qual apenas homens que podiam pagar 100 mil réis tinham direito de votar – na prática, quem tinha renda satisfatória – foi o modelo de votação durante todo o período monárquico (Constituição de 1824). A proibição do voto das mulheres, dos analfabetos e o voto controlado pelos coronéis, o voto de cabresto, foi uma realidade até início do século XX. A Constituição Federal de 1988 tornou o voto universal, direto e secreto, garantindo que cada voto seja igualmente válido independente de gênero, etnia, cor, religião e classe social. A liberdade e a igualdade do exercício da soberania popular exige que o voto seja consciente e, para tanto, que conheçamos o funcionamento do sufrágio e a sua importância.
Em contrapartida, o descaso com o voto e a falta de cuidado com as questões políticas podem custar muito caro a uma sociedade. A começar pela falta de representatividade nas casas de exercício de poder (Assembleias, Câmara, Senado e Congresso) de determinadas pautas e setores da sociedade, que são suprimidos por um grupo dominante. A democracia se efetiva quando todos igualmente participam. A participação na vida política é importante para que políticas públicas estejam alinhadas com os interesses e as necessidades de todos os setores e grupos da sociedade. O planejamento do setor público deve refletir os anseios do povo e garantir a cidadania a todos. Deve-se ter consciência de que o interesse público, que compreende os interesses dos três setores, encontra no voto amparo legal e o seu mais legítimo meio de execução.
2020 é ano eleitoral. Reflita.
Sheila Paulino e Silva, bacharel, mestre e doutora em Filosofia pela USP, pós-doutoranda em Filosofia Antiga pela UFSCAR. Internacionalista. sheilapaulinofilo@gmail.com